Doem os meus pés. As minhas mãos. O meu nariz. De frio que entra pelo que não acorberto, de tão teimoso. Um frio cortante e surdo. Grito tão alto quanto posso, arranco os pulmões de mim para consumar a frase no ar: é Outubro. Não deveria estar tão frio, nem nevar. A última vez que nevou em Outubro foi 70 anos atrás. Então é assim, volto do Brasil, saio do calor de 36 graus e vem essa porcaria de frio me agasalhar, cobrindo o céu de um cinza mal-vindo.
Que se danem.
Os dedos sentem caimbras, ou será o cérebro? Eu, aqui, me sentindo o rapaz de 30 anos mais infantil do mundo, um ser que ainda tem crises de lugar. Viajar para mim nunca será sinônimo de. Eu cobiço. Eu quero mudar tudo.
Que se danem, eles.
E vejo os livros me encarando com as suas aparências perfeitas na minha estante. Para que diabos eu tinha de saber escolher? Levanto, jogo todos no chão, como uma mulherzinha, e depois choro, como uma mulherzinha.
Que se danem, elas.
Levanto para tomar um chocolate quente, e não há açúcar. Há coisa mais triste? Abro o armário do flatmate e ele aparece. Caralho, por que droga você não ficou no seu quarto?
I was just looking for sugar, I ran out, digo todo sem graça.
So did I, ele diz.
Há coisa mais triste que uma casa sem açúcar? Vou para o meu quarto, com o meu chocolate amrgo, pensando por que às vezes é tão difícil ser, e que eu queria ser invisível como você, desnecessário como você, que vem aqui com os seus passinhos pacatos e sorrateiros ler o diário dos outros, enquanto eu durmo do outro lado mundo.
Que se danem todos vocês.
Tuesday, 28 October 2008
Sunday, 26 October 2008
Incompreensões
A cidade e as suas linhas riscadas no céu. Outra vez, eu vejo Stella caminhar oferecendo ao vento o balançar do seu vestido, com aquele mesmo ar desencontrado. O cortar das ruas a faz querer guardar a cidade dentro de si. Como um refúgio para si mesma. Stella já partiu outras vezes, já chegou outras vezes, já aportou. Outras vezes.
Ela desvenda Amsterdam com olhos de garota. A estação de trem principal e suas direções todas. E já não sabe definir se o ar aqui é mais leve, ou mais pesado, de que substância o ar é constituído, agora. As vitrines e suas palavras incompreensíveis. Stella gosta de palavras, quanto maiores melhor. As vitrines se sucedem até o Red Light District, onde as vitrines refletem os seus olhos, em cada puta escancarada sorrindo um sorriso que Stella aprendeu faz tempo. Stella decide que nunca será uma puta em Amsterdam, porque Stella não quer viver de espera, e as vitrines são turvas visões de putas esperando caladas, sofrendo caladas. Elas e seus sorrisos.
Stella gosta de andar pela cidade. A cidade tem um ar que Stella agora resolveu chamar de. Mas não é isso ainda. Stella gosta particularmente de andar de metrô em Amsterdam, porque os trens atravessam o resíduo espacial e revelam os canais e não saem do chão. Não há de se subir escadas para se pegar o metrô de Amsterdam. Stella tem chão.
No desenrolar das esquinas, Stella quer o emprego da vitrine do bar. Mas Stella não quer mudar de vida, não quer ter que recomeçar. Stella não aguenta mais. O cansaço do mundo grudou todo no solado de Stella, e ela não sabe mais. Qual a substância do ar?
Ela desvenda Amsterdam com olhos de garota. A estação de trem principal e suas direções todas. E já não sabe definir se o ar aqui é mais leve, ou mais pesado, de que substância o ar é constituído, agora. As vitrines e suas palavras incompreensíveis. Stella gosta de palavras, quanto maiores melhor. As vitrines se sucedem até o Red Light District, onde as vitrines refletem os seus olhos, em cada puta escancarada sorrindo um sorriso que Stella aprendeu faz tempo. Stella decide que nunca será uma puta em Amsterdam, porque Stella não quer viver de espera, e as vitrines são turvas visões de putas esperando caladas, sofrendo caladas. Elas e seus sorrisos.
Stella gosta de andar pela cidade. A cidade tem um ar que Stella agora resolveu chamar de. Mas não é isso ainda. Stella gosta particularmente de andar de metrô em Amsterdam, porque os trens atravessam o resíduo espacial e revelam os canais e não saem do chão. Não há de se subir escadas para se pegar o metrô de Amsterdam. Stella tem chão.
No desenrolar das esquinas, Stella quer o emprego da vitrine do bar. Mas Stella não quer mudar de vida, não quer ter que recomeçar. Stella não aguenta mais. O cansaço do mundo grudou todo no solado de Stella, e ela não sabe mais. Qual a substância do ar?
Tuesday, 14 October 2008
E(ssa) Cidade
Primeiros dias
A vista do aeroporto de Salvador é mesmo um sinal de boas-vindas. Bambus se entrelaçam, cobrindo o céu, conduzindo-nos até o extremo final que nos faz querer respirar o ar fresco da cidade numa noite de primavera. É o sinal que preciso para saber que estou em casa.
A casa brinca comigo, me sinto uma criança perdida. Já não sei onde se guarda as coisas, ou as coisas se guardam em outros lugares. Uma mistura de estranhamento e memória. Saio, à noite, as ruas parecem desgastadas, as pessoas de repente me parecem todas iguais. Quero dançar e me restam poucas opções em Salvador. Lá, onde vou, o único lugar que me diz nesta noite, já não me sinto parte de nada – eu acho que nunca me senti parte; preciso de doses de alcool para adormecer o pensamento.
Talvez estes quatro anos morando no exterior tenham me dado algo que eu não sei contar. Os meus grandes amigos se mandaram também, e os poucos conhecidos com quem esbarro pelo caminho, mal querem papo. Não estou certo se intimido ou desagrado. Mas eu nunca estive tão confortável com o fato de ser quem sou.
Andando pela Barra, vendo a orla se revelar, acho tudo muito bonito e triste. A cidade deixou de ser minha no dia em que pisei aqui, desde sábado passado. Os meus gestos, valores, modo de agir e pensar refletem outra cultura. Estranho esta completa distância, o fato de ver uma cidade se movimentando no seu dia-a-dia de longe, e isto permite que eu entenda quem fui, as minhas motivações mais básicas, padrões de reações. O meu estranhamento passado, quando eu vivia aqui e não era nada disso. E era tão isso e não sabia.
A cidade e eu estabelecemos uma relação infantil, que me faz lembrar de uma música boba que diz assim ‘I keep falling in and out of love’. Às vezes, penso que morar aqui de novo seria o maior barato. Provar da sua alternatividade, ter a companhia de pessoas que adoro, estar à parte do que não interessa, dançar seu ritmo nervoso, a sua necessidade de congruência presente numa geração que cresce a meia-luz.
Outras, quando deparo com a suas deficiências, o seu antiquado modo, a sua dependência dos EUA, a sua ligação excessiva a super-estruturas, como religião e tradições passadas, me fazem querer correr para o aeroporto. Tento, em vão, ver a Cidade como uma anfitriã que me recebe de braços abertos, e curtir os dias sem análise, crítica ou opinião. Ainda bem que nada é tão urgente assim, que ninguém me ouve.
Deixe a Cidade seguir sem mim.
A vista do aeroporto de Salvador é mesmo um sinal de boas-vindas. Bambus se entrelaçam, cobrindo o céu, conduzindo-nos até o extremo final que nos faz querer respirar o ar fresco da cidade numa noite de primavera. É o sinal que preciso para saber que estou em casa.
A casa brinca comigo, me sinto uma criança perdida. Já não sei onde se guarda as coisas, ou as coisas se guardam em outros lugares. Uma mistura de estranhamento e memória. Saio, à noite, as ruas parecem desgastadas, as pessoas de repente me parecem todas iguais. Quero dançar e me restam poucas opções em Salvador. Lá, onde vou, o único lugar que me diz nesta noite, já não me sinto parte de nada – eu acho que nunca me senti parte; preciso de doses de alcool para adormecer o pensamento.
Talvez estes quatro anos morando no exterior tenham me dado algo que eu não sei contar. Os meus grandes amigos se mandaram também, e os poucos conhecidos com quem esbarro pelo caminho, mal querem papo. Não estou certo se intimido ou desagrado. Mas eu nunca estive tão confortável com o fato de ser quem sou.
Andando pela Barra, vendo a orla se revelar, acho tudo muito bonito e triste. A cidade deixou de ser minha no dia em que pisei aqui, desde sábado passado. Os meus gestos, valores, modo de agir e pensar refletem outra cultura. Estranho esta completa distância, o fato de ver uma cidade se movimentando no seu dia-a-dia de longe, e isto permite que eu entenda quem fui, as minhas motivações mais básicas, padrões de reações. O meu estranhamento passado, quando eu vivia aqui e não era nada disso. E era tão isso e não sabia.
A cidade e eu estabelecemos uma relação infantil, que me faz lembrar de uma música boba que diz assim ‘I keep falling in and out of love’. Às vezes, penso que morar aqui de novo seria o maior barato. Provar da sua alternatividade, ter a companhia de pessoas que adoro, estar à parte do que não interessa, dançar seu ritmo nervoso, a sua necessidade de congruência presente numa geração que cresce a meia-luz.
Outras, quando deparo com a suas deficiências, o seu antiquado modo, a sua dependência dos EUA, a sua ligação excessiva a super-estruturas, como religião e tradições passadas, me fazem querer correr para o aeroporto. Tento, em vão, ver a Cidade como uma anfitriã que me recebe de braços abertos, e curtir os dias sem análise, crítica ou opinião. Ainda bem que nada é tão urgente assim, que ninguém me ouve.
Deixe a Cidade seguir sem mim.
Tuesday, 7 October 2008
2nd class stamp
Dear Ana,
Resolvi, desta vez, percorrer outros caminhos, fugir das cidades grandes, destes aglomerados de seres apressados. Ficarei estes dias só na Bahia, vendo o pôr-do-Sol do Farol e as estrelas da noite de ontem. Depois, irei ao Sertão, buscar a simplicidade em si.
Não me aguarde para o café ainda, apesar de maturar em mim um desejo de ir-me para Sampa de vez. Sinto que a hora não é agora. Londres está me seduzindo com outros ares que respiro hipnotizado sem pensar ao sair do trabalho e subir a Portobello Road.
Tomei banho de mar hoje após dois anos. Essa pele nova que se apodera de mim é tão auto-explicativa que até me assusta. Parece que agora eu me entendo, pescando frases soltas no ar, corredores de opiniões alheias e olhos estranhos.
Eu vim aqui porque aonde quer que eu more agora, eu vou morar em mim. Um ser aprisionado em si mesmo.
Resolvi, desta vez, percorrer outros caminhos, fugir das cidades grandes, destes aglomerados de seres apressados. Ficarei estes dias só na Bahia, vendo o pôr-do-Sol do Farol e as estrelas da noite de ontem. Depois, irei ao Sertão, buscar a simplicidade em si.
Não me aguarde para o café ainda, apesar de maturar em mim um desejo de ir-me para Sampa de vez. Sinto que a hora não é agora. Londres está me seduzindo com outros ares que respiro hipnotizado sem pensar ao sair do trabalho e subir a Portobello Road.
Tomei banho de mar hoje após dois anos. Essa pele nova que se apodera de mim é tão auto-explicativa que até me assusta. Parece que agora eu me entendo, pescando frases soltas no ar, corredores de opiniões alheias e olhos estranhos.
Eu vim aqui porque aonde quer que eu more agora, eu vou morar em mim. Um ser aprisionado em si mesmo.
Thursday, 2 October 2008
Mensagem para a minha família
Hi Guys,
Hope all is well. I have been looking up the details for arrival and the scheduled time is shown as 17:45. I won't have a penny, cause all my cash will be in GPB. So if you could take 2 Reais with you to buy me an Acarajé, I would be sooo glad, I could weep. Hehehe
Love,
Breno
Hope all is well. I have been looking up the details for arrival and the scheduled time is shown as 17:45. I won't have a penny, cause all my cash will be in GPB. So if you could take 2 Reais with you to buy me an Acarajé, I would be sooo glad, I could weep. Hehehe
Love,
Breno
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